Começa Pelas Mãos e Termina No Coração

O prazer é abrir as mãos e deixar escorrer sem avareza o vazio-pleno que se estava encarniçadamente prendendo. E de súbito o sobressalto: ah, abri as mãos e o coração, e não estou perdendo nada! E o susto: acorde, pois há o perigo do coração estar livre!
Até que se percebe que nesse espraiar-se está o prazer muito perigoso de ser. Mas vem uma segurança estranha: sempre ter-se-á o que gastar. Não ter pois avareza com esse vazio-pleno: gastá-lo.
(Clarice Lispector)


Fotografia: Anderson Vieira

      Tem dias que a gente só precisa ouvir o instinto, obedecê-lo pode parecer complexo no início, mas depois se consegue dançar, é só deixar começar pelas mãos. Sempre termina no coração.
      Nesta semana, dançamos novamente, o que interessa é dançar despreocupadamente e deixar que as respostas e movimentos surjam, pois surgirão, até o não movimento está coberto de uma gama de movimentos, e a gente se movimenta e depois dança.



      Continuamos investigando o silêncio e as múltiplas informações da personagem principal da tragédia lispectoriana. Um corpo poético é o que se visualiza. Objetos esvoaçantes nos corpos dos atores protegem-nos de uma dança esvaída, e segura todas a inspiração dos movimentos em sua pela.
      Não acreditamos que para dançar precisamos de música, mas talvez tenhamos nos utilizado de um golpe baixo - prazeroso - receber como estimulo uma arte que nos invade sem permissão, sem noção do tempo.


Fotografia: Anderson Vieira


Nem sei como lhe explicar minha alma. Mas o que eu queria dizer é que a gente é muito preciosa, e que é somente até um certo ponto que a gente pode desistir de si própria e se dar aos outros e às circunstâncias.
(Clarice Lispector)


    Neste momento estamos buscando a nossa dança pessoal, encontrando a nós mesmos, para depois nos perdermos, para depois nos encontramos novamente. Só assim, depois disso poderemos encontrar o outro. Até o momento temos dançado sozinho e nos conectado ao outro de forma indireta - na dança. Não precisa-se de cerimônia para dançar, basta entrar na sala tirar o calçado e fechar os olhos. 
   Com tecidos, experimentamos a nossa atmosfera invadida por outro objeto. Como minha dança reage a mais um corpo - ainda não humano - na mesma cinesfera que a minha? 


Fotografia: Anderson Vieira


     Também recebemos a visita de Rosa Calheiros, atriz, cabeleireira e maquiadora, estudante de Artes Cênicas e que estará conosco no que se diz respeito a "maquiagem e caracterização". A mesma também nos fotografou e começa agora o seu trabalho "clariado". 

Fotografia: Rosa Calheiros

       Mais importante que elaborar um espetáculo com muito esforço e suor, é realizar um encontro com prazer e alegria. A gente não quer só ensaiar, a gente quer "alegria, brincadeira, medo, comida, amor, casa e árvore". 


Vamos Pensar Um Pouco... 





Na foto: Rayane Wise


Primeiro dançar sentindo a música livremente.
Depois jogo de concentração e preocupação.
Perna, dedo, mão.
Dançar sentindo a história de um personagem (Pecadora Queimada).
Como anda o Personagem (livre, orgulhosos, cheio de vida e de amor).
Medo - movimento do medo de tentar prosseguir.
(Rayane Wise)







Na foto: Meire Benuche e Jailson Natividade
Muito interessante experimentar outras possibilidades do corpo (árvore 10%, 100%).
Guardar, o olhar, dançar (20 minutos), deixa o corpo mais livre e aberto para receber os códigos do texto e as lembranças do que já foi elaborado anteriormente.
Ao final, todos, com seus corpos, olhares cheiros farão o formato do projeto proposto.
(Jailson Natividade)

Qual seria o corpo do pecado? E o pecado resignado num caminhar em direção ao fogo? Por um breve instante experimentei seu fado, suas angústias e sua coragem. Surpreendi-me com o que senti, pois seus sentimentos invadiram-me tão fortemente que esqueci e ao mesmo tempo lembrei como nunca a força de um julgamento. 
(Meire Benuche)



Na foto: Diogo Honorato
A dança tomou conta do nosso corpo hoje, criando fantasias, quebrando nossos medos e realizando sonhos, os sonhos mais íntimos, os desejos mais fortes.
Que marcas o meu jeito de andar revela? Quem sou eu dentro de mim, dentro do meu quarto, dentro do mundo? 
O que me faz reagir com meu outro eu, que até então ficava do meu outro lado.
(Diogo Honorato)






Na foto: Cleci Nascimento

Penso que o encontro ter começado com música e expressarmos corporalmente o nosso interior foi um ponto bastante interessante e importante para o desenrolar do nosso encontro e o alongamento que veio depois desse momento foi crucial para a proposta do dia de hoje. O véu foi um elemento importante para a construção do nosso personagem e me ajudou a ver a construção do projeto sob outra perspectiva. Me veio um cheiro doce no desenrolar do nosso encontro. (Cleci Nascimento)




Dançamos no ritmo da música.
Dançar deu uma sensação de leveza, que me fez pensar que a personagem pecadora, talvez, não seja tão pecadora como no texto.
Brincamos de perna, dedo, mão.
Hoje saio daqui com mais vontade e animo, é sempre muito bom os ensaios.
Palavras chaves de hoje: Animo, vontade, alegria, e dedicação.
(Mare Gomes)

E assim Jesus absorveria a pecadora sem nome e desconhecida, mas Jesus não é Clarice, e Clarice não sendo Jesus matou a pecadora queimada. Pois é, enfim chegamos à personagem que dá nome a única peça teatral de Clarice, chegamos desconhecendo-a e não a entendo, mas com vontade de pesquisar, testar, transformar o abstrato em concreto.  Já dizia Clarice que ninguém nasce pronto e que a vida é pra quem é corajoso o suficiente para se arriscar e humilde o bastante para aprender. Já estamos nos arriscando com um projeto tão sublime e tão complexo, já estamos sendo humildes aceitando as críticas construtivas vindas dos nossos convidados, então que continuemos sendo corajosos para arriscar cada vez mais e aprender cada vez mais e que não nos falte coragem, humildade e claro, Clarice. (Bruno Leon)

 Semana que vem investigaremos um novo espaço. Qual será? Veremos! 

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